sábado, 8 de março de 2014

Como uma criança, que, quando cai, busca um olhar onde se apoiar, tentei, às cegas, um porto. Me afoguei. Meu corpo, depositado sob o peso da eternidade, jazia com olhos de estátua. Eu era todo passado, nunca mais porvir, apenas o feito e dito e calado e explodido e sufocado. Sem possibilidades, sem remédio, sem segunda chance.

Morrer não doía, mas incomodava o silêncio zumbindo de fundo de mar. Me afoguei. Era dia quente, o horizonte fingia um sorriso. Eu era só aquilo mesmo, uma confusão precipitada querendo arrebentar ondas.

Minha boca se inundou de sal, busquei, com olhos inchados, qualquer mínima vida, o conforto de qualquer suspiro. Me afoguei. Não doía. Apenas os músculos, tomados de uma convulsão instintiva, ardiam. Queria a terra firme, a segurança dos pés fincados, os olhos calmos, só o gosto distante da maresia.

Me afoguei. Foi como se o tempo demorasse mais sob as águas. Segundos se arrastando enquanto a vida inteira se projetava numa exibição feroz. Não era medo nem tristeza, era um movimento primitivo de tentar reter a vida.

Acordei com um grito engasgado. A cama e os móveis, mudos. Chorei.

E o tempo se moveu.




(Mateus Borba) 

Um comentário:

  1. Sei lá.
    Milhões de coisas passaram em minha cabeça agora.
    Mas o sofrimento mais dolorido é bem assim.
    Quando a gente acha força pra reagir e acorda, a dor já foi. Só fica o choro que parece que dura uma vida.

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